Saúde

Estudo mapeia bactérias do maior Complexo Hospitalar da América Latina

Por Roberta Massa | 09.05.2016 | Sem comentários

Quantas famílias de bactérias habitam os botões dos elevadores, as teclas dos caixas eletrônicos, os relógios de ponto ou as superfícies dos banheiros do maior complexo hospitalar da América Latina, o Hospital das Clínicas de São Paulo?

Uma equipe do Instituto de Medicina Tropical da USP decidiu investigar as áreas de grande circulação do HC e frequentemente tocadas pelas mãos e fez um “censo” da população bacteriana.

Foram identificados 2.832 gêneros de 926 famílias.

Os pesquisadores dizem que já esperavam encontrar um grande número de bactérias por causa da precisão do método de biologia molecular usado, que lê rapidamente milhões de fragmentos de DNA ao mesmo tempo.

A surpresa, no entanto, foi a enorme diversidade dessa população bacteriana, o que indicaria falhas na higienização das mãos e na rotina de limpeza do hospital.

“Nunca vai existir um ambiente livre de bactérias, mas a diversidade delas surpreendeu muito.

Nem dá para dizer qual ambiente está mais sujo. Está tudo igualmente sujo”, diz o pesquisador Sabri Sanabani, do Instituto de Medicina Tropical da USP, um dos autores do estudo.

O trabalho foi publicado na revista científica “International Journal of Environmental Research and Public Health”.

A maioria das bactérias isoladas pertence à flora normal (habitam o intestino e a pele das pessoas, por exemplo) e não traz grandes riscos a pessoas saudáveis.

Mas algumas são potencialmente perigosas a pacientes imunodeprimidos e, segundo a literatura médica, responsáveis por muitos casos de infecções hospitalares.

Foram identificados, por exemplo, 35 diferentes variedades da bactéria Streptococcus ssp. Uma delas (Streptococcus pyogenes), isolada nos elevadores e bancos eletrônicos, causa desde faringites bacterianas até quadros mais graves como choque séptico (situações raras).

A Staphylococus foi encontrada em todas as superfícies pesquisadas. Entre elas está a S. epidermidis, presente na pele e nas mucosas e responsável por até 22% das infecções hospitalares nas UTIs dos Estados Unidos.

Também foi identificada, com menos frequência, a S. aureus, ligada a infecções mais graves, como pneumonia, endocardite e meningite.

Salmonella enterica, responsável por muitos casos de intoxicação alimentar, foi encontrada em todas áreas.

Segundo Sanabani, esse tipo de estudo é importante para conhecer melhor a comunidade bacteriana e investigar como esses agentes são transmitidos de lugar para lugar e de pessoa para pessoa.

O infectologista Esper Kallás, professor da USP, diz que é preciso ter cautela ao interpretar os dados da pesquisa. “Encontrar um monte de bactérias no botão do elevador, teclados, superfícies de banheiros e no relógio de ponto não seria novidade nenhuma. Agora, se representa risco de infecção, é diferente.”

O estudo não faz nenhuma associação entre a identificação das bactérias e eventual aumento de infecção no HC.

Para Kallás, a conclusão do estudo, de que a alta diversidade de bactérias pode ser atribuída a falta de higiene, é precipitada porque não foram adotados controles que suportem essa hipótese.

Medidas Preventivas

Para o pesquisador Sabri Sanabani, há caminhos que podem ajudar a melhorar as condições de higiene no hospital, como o reforço da limpeza dos ambientes ou mesmo reformas de áreas.

Ele sugere também o uso de uma voz automatizada nos principais ambientes, como corredores e salas de espera, alertando para a importância da higiene das mãos.

O infectologista Artur Timerman, chefe do serviço de controle de infecção hospitalar do Hospital Edmundo Vasconcelos (SP), explica que as mãos são os principais veículos na transmissão das bactérias que estão no meio ambiente.

Com água e sabão ou álcool gel, 99% desses germes podem ser eliminados.

“O índice de profissionais de saúde que lavam corretamente as mãos não chega a 50%. Quando tem campanha, chega a 60%, 70%, mas isso só dura uma semana”, diz.

Timerman considera mais eficaz um programa de educação continuada nos hospitais, com supervisão, do que campanhas preventivas isoladas. “Tinha que ter gente fiscalizando se as pessoas lavam ou não as mãos.”

O estudo no HC faz parte de uma investigação mais ampla do grupo de pesquisadores, que pretende mapear toda população bacteriana que possa representar perigo para a saúde pública.

O grupo já utilizou as mesmas técnicas para analisar notas de dinheiro e planeja estudar o microbioma no sistema de ar-condicionado nas linhas do metrô.

Controle de Infecções

O Hospital das Clínicas da FMUSP afirmou em nota que, por não conhecer o protocolo da pesquisa citada, não se manifestaria especificamente sobre ele.

O hospital, porém, informa que realiza de forma permanente o controle de infecção hospitalar por todo o complexo, inclusive nas áreas de grande circulação, e tem equipes de médicos e enfermeiros dedicados integralmente à tarefa e equipes de limpeza atuando continuamente.

O HC disse ainda que tem uma comissão de controle de infecção hospitalar responsável por coordenar todas as ações de prevenção e controle de infecções no hospital.

“Cada um dos oito institutos possui equipe própria para realizar o controle e prevenção. As ações são realizadas continuamente em todo o complexo.

Todos os profissionais ligados à assistência devem seguir os dois guias de procedimento do hospital para a área, com normas para a utilização de anti-infecciosos e recomendações para a prevenção de infecções e para a assistência segura para pacientes e profissionais de saúde”, afirmou.

Além disso, o hospital informou que realiza campanhas de higienização e possui álcool gel em pontos de grande circulação e próximos a locais como elevadores e pontos eletrônicos.

Fonte: Folha de São Paulo-09.05.2016

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