A judicialização da saúde: implicações e dilemas para o SUS
Por Redação GeHosp | 27.04.2023 | Sem comentáriosA judicialização da saúde é um fenômeno que tem ganhado destaque nos últimos anos no Brasil.
Para quem não conhece a palavra, trata-se da utilização do sistema judiciário para garantir o acesso a medicamentos, produtos ou procedimentos que não estão disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS).
Essa prática tem sido bastante debatida no meio jurídico e na saúde pública, devido às possíveis implicações que podem trazer para gestão e o financiamento do SUS.
De acordo com informações fornecidas pelo Insper – Instituto de Ensino e Pesquisa -, a quantidade de processos relacionados à saúde que tramitaram na primeira instância do Judiciário brasileiro teve um expressivo aumento entre 2009 e 2017. Durante esse período, houve um incremento de 198% na quantidade de casos.
O tema, que inquieta gestores em todo o país, apresenta características difusas que suscitam importantes questionamentos acerca da efetivação dos direitos à saúde, dos limites entre o direito individual e coletivo, do financiamento, da formulação de políticas públicas e do perfil dos litigantes envolvidos.
A saúde como um Direito
A demanda por soluções judiciais na área da saúde no Brasil teve início com a inclusão do direito à saúde na Constituição Federal de 1988, previsto no artigo 196.
Quando o cidadão não consegue obter acesso adequado aos serviços e tratamentos de saúde, muitos indivíduos recorrem à justiça para solicitar tratamentos que não são disponibilizados pelo SUS ou que possuem um valor muito alto na rede privada.
Tal fenômeno pode ter consequências negativas para a gestão do SUS, como a desorganização da rede de saúde, o aumento de gastos com medicamentos e tratamentos de alto custo e a sobrecarga do sistema judiciário.
Além disso, a decisão individual dos juízes pode interferir na política de saúde pública, desconsiderando critérios técnicos e prioridades estabelecidas pelas autoridades sanitárias.
Por outro lado, a judicialização também pode ser vista como uma forma de pressionar o Estado a cumprir seu dever de garantir direitos fundamentais.
A participação do poder judiciário pode contribuir para a efetivação desses direitos, especialmente em casos de negativa de acesso a medicamentos e tratamentos essenciais.
Diálogo entre gestores e Poder Judiciário
Para lidar com o problema é necessário que os gestores, incluindo o Ministério da Saúde, constantemente reformulem as políticas de Assistência Farmacêutica e os procedimentos administrativos e burocráticos.
A alocação de recursos para atender às demandas judiciais pode prejudicar a capacidade de atendimento dos pacientes que dependem do sistema público de saúde pelos canais regulares.
A sociedade está cada vez mais consciente de seus direitos, o que exige a intervenção do Poder Judiciário para solucionar conflitos entre gestores e a população.
Esse cenário apresenta um dilema que requer soluções para preservar os princípios e diretrizes do SUS.
Uma alternativa proposta é o diálogo entre gestores de saúde e as instâncias do Poder Judiciário.
Já existem iniciativas em alguns estados brasileiros de ambas as partes para minimizar os custos da judicialização excessiva.
Por fim, a litigiosidade no âmbito da saúde é uma temática complexa que demanda uma abordagem multidisciplinar e uma análise cuidadosa das implicações que essa prática pode ter para a saúde pública.
É imperativo encontrar um equilíbrio entre o direito à saúde e a preservação dos recursos e a viabilidade do sistema.
Por: Midya Gurgel-Cirurgiã-dentista – Pós-Graduada em Gestão em Saúde e Direito Sanitário – 27.04.2023