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Equipamentos de medicina a distância impulsionam empresas nos EUA

Por Roberta Massa | 21.08.2017 | Sem comentários

Ele poderia estar surfando em Cabo San Lucas, no México. Mas Tyler Crouch passou as férias do verão de 2013 criando um estetoscópio digital, e pensando:

“Tomara que isso valha a pena”. Ele tinha 21 anos e era estudante de engenharia mecânica.

De lá para cá, Crouch e dois colegas da Universidade da Califórnia em Berkeley criaram uma empresa -a Eko Devices, sediada na cidade.

Arrecadaram quase US$ 5 milhões em capital e venderam 6.000 estetoscópios digitais, usados em 700 hospitais.

Os equipamentos, sem fio, transmitem dados de batimentos cardíacos e outros sinais vitais ao portal da Eko, onde, entre outras coisas, as informações podem ser acessadas por novos médicos para uma segunda opinião.

Agora eles criaram o Duo, um estetoscópio digital de uso caseiro, que pode mudar a maneira pela qual os pacientes cardíacos são monitorados, dizem os empreendedores.

O produto deve começar a ser vendido nos EUA, com receita, no fim do ano.

O Duo se encaixa na mão do paciente e combina leituras de eletrocardiograma e de sons do coração em um aparelho que permite aos pacientes monitorarem sua saúde em casa e enviarem os dados a seus médicos.

Jovens empresários

Os sócios da Eko Devices têm menos de 30 anos. Connor Landgraf, 26, é bioengenheiro. Jason Bellet, 24, se formou em administração de empresas.

Nenhum deles tem diploma de medicina, mas contam com a orientação de médicos desde o início.

A equipe da empresa depende dos cardiologistas da Mayo Clinic, da Universidade Stanford, do Massachusetts General Hospital e da Universidade da Califórnia em San Francisco, para consultoria.

O Duo propicia a pacientes cardíacos domésticos “um exame de nível semelhante ao que um cardiologista daria”, diz a médica Ami Bhatt, professora de medicina na Universidade Harvard.

Bhatt, consultora da Eko, receberá uma opção de ações de valor modesto como remuneração por seu trabalho e disse que acompanhar os pacientes onde quer que eles vivam permitirá que os cardiologistas intervenham “antes de uma crise”.

Outros médicos dizem ser cedo para saber até que ponto esses dispositivos móveis de medicina, como os que monitoram diabetes, asma e distúrbios do sono, serão úteis.

Isso porque nem sempre se pode confiar que os pacientes empregarão a tecnologia de modo correto ou constante.

“Há um grande investimento nesses itens. As pessoas estão apostando que um mercado irá se desenvolver nesse segmento, mas isso ainda não aconteceu”.

Diz Jeffrey Olgin, professor de medicina na Universidade da Califórnia em San Francisco.

A telemedicina já movimenta US$ 9,2 bilhões ao ano, segundo Bruce Carlson, da Kalorama Information, empresa de pesquisa especializada em saúde.

O segmento cresce 8% ao ano, quase três vezes acima da média dos demais dispositivos médicos.

O Duo está ingressando em um campo altamente competitivo. O Kardia Mobile, um produto mais estabelecido, tem o tamanho de um pacote de goma de mascar, conecta-se à traseira de um smartphone e faz um eletrocardiograma em 30 segundos.

O aparelho está à venda na Amazon por US$ 99. No segundo trimestre deste ano, a AliveCore, fabricante do Kardia Mobile, recebeu mais de US$ 30 milhões em capital -o que inclui montante não revelado investido pela Mayo Clinic, que colabora com a empresa no desenvolvimento de seus produtos.

Mas a concorrência não desanima os empreendedores que criaram a Eko Devices. De acordo com Bellet, se os seus dispositivos atingirem 10% do mercado potencial.

“Isso fará de nós uma companhia de US$ 1,2 bilhão.”

Mas há muitos fatores ainda desconhecidos. A equipe da Eko descobriu que a medicina não é como outros setores.

“O ciclo para levar um produto ao mercado é de cinco a dez anos, porque o setor é regulamentado e se movimenta lentamente”, afirma.

Muitas pequenas empresas estão desenvolvendo aparelhos de monitoramento caseiro, diz Bellet, “mas os médicos não querem informação contínua”.

Eles só querem saber quando há um problema, diz Robert Pearl, professor de política de saúde na Universidade Stanford.

Os médicos desejam tempo para falar com os pacientes e alguns são avessos à tecnologia.

Os dados tem que ser integrados à ficha médica do paciente, e isso é algo em que ele e seus sócios estão trabalhando, diz Bellet.

As empresas de seguros precisam concordar em reembolsar os custos desse tipo de aparelho.

Olgin, da Universidade da Califórnia em San Francisco, disse acreditar fortemente que “não basta avaliar os dispositivos de telemedicina como bens de consumo”.

“Eles deveriam ser testados como os medicamentos, porque há consequências imprevistas”, afirma Olgin.

Fase de aprovação

O mercado para produtos capazes de detectar problemas cardíacos é grande nos Estados Unidos.

O governo estima que 610 mil pessoas morrem de insuficiência cardíaca a cada ano, a principal causa de óbitos no país, e metade dos pacientes que têm alta nos hospitais ainda retornam em seis meses.

As pessoas acompanham o seu estado de saúde pesando-se diariamente e buscando sinais que possam significar retenção de água no corpo.

Indicativo de que o coração não está funcionando da forma como deveria.

O Duo, estetoscópio digital de uso caseiro, pode ajudar no diagnóstico e foi aprovado em maio pela FDA (Food and Drug Administration), a agência americana de fiscalização e regulamentação de alimentos e remédios.

Nos dois próximos anos, a companhia participará de dois estudos conduzidos pela Universidade da Califórnia.

“Se você comparar a Eko com a Uber, por exemplo, verá que estamos avançando com muita lentidão”, diz Bellet.

“Mas, se nos comparar ao setor de saúde em geral, estamos nos saindo bem.”

Há outras doenças que podem ser monitoradas com tecnologias parecidas. Charvi Shetty, que estudou com Landgraf em Berkeley, seguiu percurso parecido ao da Eko Devices.

Seu projeto de graduação em bioengenharia era um aparelho para pacientes com asma.

Cinco anos depois, ela é presidente da Knox Medical Diagnostics, start-up que desenvolveu um dispositivo para que crianças asmáticas possam monitorar a saúde em casa e enviar resultados aos médicos por aplicativo.

O produto está sendo testado pela Universidade da Califórnia, que ajuda no desenvolvimento e na captação de recursos.

O aparelho é um espirômetro portátil que mede obstruções e inflamações nos pulmões e alerta os pais antes de um ataque de asma.

Mais de 8% das crianças dos Estados Unidos têm asma, de acordo com estatísticas do governo, o que representa um quarto dos pacientes do país com a doença.

Um estudo constatou em 2010 que elas respondem por um um terço das internações hospitalares anuais por asma.

Depois de testar o aparelho, Shetty adicionou um jogo de videogame ao aplicativo para encorajar os pequenos a usá-lo.

“Com o app, algumas crianças conseguem entender a situação da saúde melhor do que os adultos”, completa.

Em novembro, o Aeris estará disponível nos EUA, para fins de pesquisa, por US$ 99 acrescidos da taxa mensal de US$ 10.

Há intenção de buscar aprovação da FDA ao aparelho ainda este ano.

Fonte: Folha de São Paulo-21.08.2017.

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