Saúde

HC treina unidades após 4 transplantes devido à febre amarela

Por Roberta Massa | 24.01.2018 | Sem comentários

Após realizar quatro transplantes de fígado para tratar hepatite fulminante causada por febre amarela, três na última semana, o Hospital das Clínicas de São Paulo começou a treinar outras instituições do país para replicar esse tipo de procedimento, até então inédito no mundo.

O primeiro centro transplantador habilitado é a Unicamp.

Nesta terça (23), médicos de 11 hospitais brasileiros passaram por capacitação.

Os pacientes transplantados, todos com falência hepática, contraíram a doença a partir de dezembro, têm entre 16 e 27 anos e foram infectados em Mairiporã e Franco da Rocha, na Grande SP.

A primeira paciente a se submeter ao transplante, uma engenheira de 27 anos, saiu nesta terça da UTI, após quase um mês sob cuidados intensivos.

Ela responde a estímulos, mas ainda não se comunica verbalmente.

“Ela chegou num estado dramático, muito grave. Já tinha tido convulsões, achamos que não ia resistir. Cerca de 90% evoluem para morte nessas condições.

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O transplante era a única chance”, conta Luiz Carneiro D’Albuquerque, chefe de transplantes de órgãos abdominais do HC e professor titular da USP.

Nesses casos, há destruição do fígado, seguida de uma série de distúrbios metabólicos, como insuficiência renal e edema cerebral.

Antes do caso da engenheira, havia a dúvida se o transplante seria efetivo pois o vírus ataca e se aloja em outros órgãos, como pâncreas, coração e rins.

“É uma doença sistêmica. Tem vírus para todos os lados”, explica Carneiro.

A hipótese da equipe do HC era de que, com um fígado novo, a paciente poderia suportar a fase da viremia (presença do vírus no sangue circulante) e sobreviver.

“Foi o que aconteceu. Houve replicação viral até o terceiro dia, ela teve problemas, como uma encefalite da qual ainda se recupera, mas saiu [do quadro mais agudo].

Já está indo para o quarto”, diz. A partir desse caso, a equipe conseguiu autorização dos comitês de ética do HC e da Secretaria de Estado da Saúde para seguir adiante.

O segundo transplante de fígado por falência hepática provocada pela febre amarela ocorreu na terça passada (16).

Um jovem de 20 anos chegou ao HC também em estado grave, com insuficiência hepática e edema cerebral.

“Conseguimos mantê-lo vivo até chegar o fígado. No plantão da noite, ele tomou 73 concentrados de hemoderivados [dez vezes mais do que um paciente com falência hepática por outras razões].”

O paciente já não respira com ajuda de aparelhos, mas continua em hemodiálise. Está estável, diz o médico.

O terceiro caso é de uma jovem de 21 anos, transplantada na sexta (19).

“Também foi um caso dramático, muito grave, que conseguimos interromper o curso [da doença] graças a um órgão”, diz.

O quarto transplante ocorreu no domingo (21). Trata-se de um adolescente de 16 anos que apresentava hepatite fulminante e complicações neurológicas pela febre amarela.

“Tiramos a sedação, ele está acordado, continua entubado, mas está evoluindo bem.”

Custo devastador

Segundo Carneiro, os casos mostraram que o transplante é o método terapêutico capaz de salvar doentes nessas situações dramáticas.

“Nosso grande problema é o ‘timing’ de indicação do transplante.

Já tivemos pacientes que evitamos o transplante por causa das complicações neurológicas e todos eles morreram”, afirma.

Para o médico, se o paciente estiver com insuficiência hepática, baixos níveis de coagulação e instabilidade neurológica (como confusão mental e sonolência).

O transplante deve ocorrer logo.”Eu não posso transplantar muito cedo porque a cirurgia pode ser desnecessária.

Mas, se for muito tarde, o paciente pode morrer antes de chegar o órgão, ou durante a cirurgia ou logo depois.”

Outro desafio é o financiamento desses casos, que, segundo o médico, tem “custo devastador”.

A estimativa é que tenham sido gastos de R$ 3 a R$ 4 milhões com esses quatro pacientes.

“Eles precisam de quantidades brutais de drogas e hemoderivados para se manterem vivos.

Precisam de exames, como eletroencefalogramas contínuos.

Monitoramos de três a quatro vezes por dia como está a coagulação e onde há deficiência e o momento em que ele precisa de plasma, de plaqueta.”

Para manter o atendimento, o médico afirma que precisará de reforço de caixa e da equipe médica e de enfermagem.

“Estamos todos exaustos, trabalhando sem descanso. E não temos como sustentar o custo extra.

Tenho compromissos com pacientes em lista de espera [para transplante de fígado por câncer ou outras doenças].”

Fonte: Folha de São Paulo – 24.01.2018.

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