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Saúde Pública: é preciso recomeçar. Caso: UBS Dona Adelaide Lopes

Por Redação GeHosp | 16.05.2019 | Sem comentários

Quem me conhece sabe que eu procuro sempre ajudar a comunidade onde moro por isso participo de ações comunitárias que envolvem, saúde, segurança e zeladoria do bairro.

Recentemente recebi um pedido de ajuda de moradores que estão tendo dificuldade para agendar consulta com médico Clínico Geral na UBS Dona Adelaide Lopes, os moradores relatam que a unidade está sem médico (clínico geral) a mais de 1 ano.

Inicialmente confesso que desacreditei, por não se tratar de um médico especialista, mas sim de um clínico geral e pela unidade estar localizada em um bairro que possui uma ótima infraestrutura. Resolvi apurar os fatos.

Logo de cara, ao analisar mais de perto alguns dados, me deparei com situações que só me fizeram chegar a uma conclusão: ou a saúde pública passa a ser encarada como prioridade e muda totalmente a sua forma de gestão de recursos ou ela jamais sairá da precariedade.

Conhecendo um pouco a Unidade Básica de Saúde

A UBS Dona Adelaide Lopes, fica situada na Avenida Clavásio Alves, nº 683 na Vila Carolina no Bairro do Limão, São Paulo.

Seu atendimento é realizado de segunda a sexta-feira das 7hs às 19 hs.

Nos períodos de campanha de vacinação ela funciona também aos sábados das 7hs às 17hs.

A unidade pertence a Subprefeitura da Casa Verde, tem como responsáveis diretos a Coordenadoria Regional de Saúde Norte e a Supervisão Técnica de Saúde da Casa Verde.

A UBS é uma unidade estadual, com modelo de atendimento tradicional, o que significa que seus colaboradores são 100% servidores públicos, sendo eles da esfera, municipal, estadual e federal.

A unidade foi inaugurada em 1.989 e foi municipalizada em 2002.

A unidade possui serviço de contra referência no tratamento especializado em psiquiatria e possui serviços de referência conforme tabela abaixo:

A unidade está habilitada para atendimento médico de Pediatria, Ginecologia, Clínica Geral, Enfermagem e Odontologia.

A unidade básica de saúde também realiza procedimentos como:

  • Inalações
  • Injeções
  • Curativos
  • Vacinas
  • Coleta de exames laboratoriais
  • Tratamento odontológico
  • Encaminhamentos para especialidades
  • Fornecimento de medicação básica
  • Participação em programas de medicina preventiva

Um ponto muito importante que torna a unidade uma referência é a sua localização estratégica em uma das principais avenidas do bairro e com fácil acesso ao serviço de transporte público, tanto aos moradores da região mais alta do bairro como da região mais extrema.

Quando analisamos os serviços de atenção primária fundamentais da unidade, que deveriam estar em pleno funcionamento e que infelizmente não estão por questões burocráticas envolvendo seu modelo de gestão, e que acabam impactando drasticamente no atendimento do paciente que deveria ser o centro do cuidado.

A unidade em questão sofre diariamente com a falta de recursos, simplesmente por fazer parte de um modelo de gestão tradicional, que não tem em sua administração uma Organização Social de Saúde (OSS).

Este é apenas um simples exemplo da falta de estrutura do atendimento primário, que acaba tendo como consequência a fuga dos pacientes aos serviços de atendimento de maior complexidade. 

Como funciona o gerenciamento através de Organização Social de Saúde (OSS)

No modelo de gestão em parceria com OSS, a Coordenadoria de Gestão e Contratos de Serviços de Saúde (CGCSS) da Secretaria de Estado da Saúde é responsável pela contratação, avaliação e controle de serviços de saúde.

O projeto assistencial é elaborado pelas áreas de planejamento dos Departamentos Regionais de Saúde ligados a Coordenadoria de Regiões de Saúde da SES, que a partir das necessidades regionais em saúde define as metas e o perfil assistencial para cada contrato de gestão.

Por meio de indicadores de qualidade, produtividade e avaliação econômico-financeira, a CGCSS gerencia e monitora o cumprimento das metas e pactuações previamente definidas em contrato de gestão.

Além disso, as Unidades de Saúde sob gerenciamento de OSS são submetidas a auditoria do SUS e a avaliação da contratualização de resultados pela Secretaria da Fazenda, bem como o controle externo exercido pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP), completando o quadro de avaliação e controle.

Assim, a responsabilidade direta pela administração da unidade é das Organizações Sociais de Saúde, mas o serviço de saúde continua sendo público – bens, mobiliários e equipamentos pertencem ao Estado – cabendo a ele o papel de planejador, administrador e fiscalizador das atividades.

Não irei entrar no mérito desse tipo de gestão, tenho algumas ressalvas em relação a esse tipo de gestão, mas está claro que sem a gestão de uma OSS por trás de uma instituição pública a situação é muito mais difícil de ser gerenciada.

UBS Adelaide Lopes: falta de colaboradores

Focando nos problemas da UBS Adelaide Lopes, um dos fatores que impactam diretamente na assistência ao paciente é a falta de colaboradores, onde o exemplo da falta de um médico clínico geral, demonstra o quanto o modelo de gestão de recursos e de pessoas é ineficiente.

A antiga médica (Clínica Geral) da unidade, realizava suas consultas diariamente por meio período, era uma médica muito querida pelos pacientes.

A médica era funcionária pública e atendia aproximadamente 25 pacientes/dia e para a tristeza e preocupação de muitos pacientes, ela acabou se aposentando a pouco mais de um ano, desde então a unidade não tem como substituir a médica pois não estão sendo realizados novos concursos públicos.

A unidade solicitou a substituição da médica em algumas ocasiões para a supervisão técnica de saúde e à coordenação regional de saúde norte, as tentativas foram todas sem sucesso.

Vale ressaltar que a situação se replica aos demais profissionais de saúde da unidade, caso o profissional apresente algum problema e necessite de afastamento, não existe colaborador substituto.

Quando um funcionário se afasta devido a férias ou até mesmo um problema de saúde, o serviço fica totalmente descoberto, até o seu retorno.

Sem dúvidas é uma situação inaceitável para um sistema que diz prezar pelo atendimento primário, controle e prevenção de doenças.

Um fator importante a ser ressaltado é que se unidade estivesse sob gestão de uma OSS (Organização Social de Saúde), certamente ela conseguiria ao menos contar com remanejamento de colaboradores das demais unidades, ou até mesmo contratar um funcionário, desde que esse recurso estivesse dentro do orçamento anual.

Outros problemas que prejudicam a eficiência e qualidade no atendimento

A unidade também sofre diariamente com falta de recursos, o único carro utilizado para visitas domiciliares aos pacientes está danificado.

Os pacientes cadastrados em programas como o de passagem de sonda vesical, não estão sendo atendidos devido à falta de materiais. Já os pacientes cadastrados para o recebimento de oxigenoterapia também não estão sendo atendidos por problemas semelhantes.

Indicadores de produção da UBS

Ao analisar alguns indicadores de produção da unidade, fica claro o quanto a falta de colaboradores está prejudicando a assistência e os serviços de apoio.

A unidade conta com 01-farmacêutico e 02 técnicos de saúde que no período analisado atenderam aproximadamente 7 mil receitas de medicamentos, onde aproximadamente 900 medicamentos não foram disponibilizados devido à sua falta.

A equipe de enfermagem que conta com 10 auxiliares de enfermagem e 2 enfermeiros realizam aproximadamente a aplicação de 600 vacinas/mês e são realizados em torno de 1.000 procedimentos de enfermagem no mesmo período.

O Grupo de Orientação Pré Natal, não é realizado devido à falta de profissional.

O projeto de Planejamento Familiar também não é realizado quando o único profissional responsável tira férias.

Não posso deixar de destacar a estrutura positiva da UBS para a assistência odontológica.

A unidade conta com uma equipe maior no atendimento odontológico de 8 dentistas e 04 auxiliares odontológicos, que realizam aproximadamente 250 consultas/mês e 7.500 procedimentos/mês.

A unidade tem uma demanda reprimida significativa para algumas consultas e exames, destaco a consulta com ortopedista que possui 150 pacientes na fila com espera aproximada de 1 ano.

A espera para uma consulta com o oftalmologista gira em torno de 5 meses onde aproximadamente 250 pacientes aguardam na fila de espera.

Quem acompanhou essa postagem até aqui percebeu que não faltam problemas, se eu detalhar, os problemas, um por um o texto irá se tornar um livro.

Os fatos deixam claro que o nosso sistema apresenta problemas graves, ressalto mais uma vez, que isso está acontecendo no Bairro do Limão, um bairro considerado de classe média e de fácil acesso.

Está nítido que outros bairros mais afastados devem padecer de problemas ainda piores. Definitivamente o sistema de saúde pública está precisando urgentemente de um crtl + alt+ del.

Reiniciando a saúde pública

A saúde pública precisa ser reiniciada para ser mais eficiente, caso contrário ela continuará na precariedade, gerando gastos desnecessários e sem retorno eficaz.

O SUS possui diversos programas que bem gerenciados com estrutura adequada, podem resultar em mudanças deixando o sistema mais eficiente.

É preciso priorizar e investir em medicina preventiva e em atendimento primário, mas também é preciso garantir o mínimo de estrutura para o pleno funcionamento de hospitais, serviços de especialidades e principalmente as unidades básicas de saúde.

O sistema precisa de mais funcionários, eles precisam estar capacitados e motivados.

Eles também precisam de metas, precisam de feedback e se mesmo assim não mostrarem eficiência devem ser substitutos.

O investimento em tecnologia, informatização e integração dos sistemas de informação, irá garantir maior controle, otimizar os processos e reduzir custos, evitando a realização de procedimentos desnecessários.

Um fator essencial é a desburocratização de processos como no de direcionamento de pacientes de referência e contra referência e na realização de parcerias público/privada.

As unidades de saúde precisam atuar de forma integrada e não atuarem como se cada espera de atendimento fosse uma empresa diferente, essa cultura organizacional precisa ser disseminada nas demais esferas secundaria e terciária.

Quer reduzir os custos do serviço terciário?

Invista no serviço primário, onde os gastos são menores e os efeitos a médio e longo prazo serão repercutidos diretamente no atendimento terciário, caso contrário os hospitais continuarão sofrendo com a demanda excessiva.

As mudanças no setor da saúde estão acontecendo rapidamente, elas vêm afetando todos os tipos de assistência (pública e privada), por esse motivo as mudanças precisam ser rápidas e drásticas.

A tecnologia será uma forte aliada no serviço público, da mesma forma que ela é no serviço privado, mas é preciso que exista inicialmente um investimento pesado, que com o passar do tempo, será revertido em economia e eficiência.

Enquanto isso não acontece vamos continuar convivendo com problemas graves e com o sofrimento dos mais pobres que precisam e contam com o atendimento do SUS.

Até a próxima!

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